quinta-feira, 26 de março de 2020

A propósito do COVID-19 mas não só ...


A propósito do COVID-19 mas não só ...

Para quem não me conhece, sou o Pedro Jorge Pereira, dinamizador, entre outros, do Projecto PJP.ECOLUTION e naquilo que é o meu trabalho diário enquanto “semeador da mudança” vou fazendo por observar o mundo e a sociedade da forma o mais atenta, consciente e profunda que me é possível.
Sendo uma questão que, inevitavelmente, marca profundamente a actualidade e mexe com tantas outras questões de forma mais ou menos directa relacionadas, não posso claro deixar de também partilhar algumas das principais reflexões que me ocorrem no que diz respeito ao choque provocado pela Pandemia de Covid-19.
São contudo reflexões que funcionam mais como preâmbulo de uma análise mais alongada e profunda que tenciono fazer e brevemente irei partilhei. Caso suscite o vosso interesse, fiquem atentos à página do projecto PJP.ECOLUTION.

Começo por dizer que os meus conhecimentos técnicos sobre a área em questão são naturalmente bastante limitados e não tenho pretensão de questionar aquilo que são os dados científicos e técnicos mais ou menos consensuais até ao momento … não obstante de a certos níveis não haver ainda propriamente um consenso …
Assim sendo a minha análise precede essencialmente da minha experiência e observação, ao longo destes anos, digamos, de activista eco-social daquilo que são as dinâmicas sociais e também … ecológicas dos ecossistemas naturais.
Suponho que para alguns poderão trazer alguns elementos novos de reflexão … para outros nem por isso e claro, valem o que valem para cada um … estou claro receptivo a críticas, comentários e terei todo o prazer (nem sempre toda a disponibilidade) em discutir ideias. Especialmente quando pudermos voltar a estar juntos socialmente e fisicamente.

Então … vamos a isto …

Desde logo acho interessante, quer dizer, na verdade acho bastante triste observar que a distância que vai dos nossos dias até ao tristes tempos da inquisição … até tempos (que não vão assim há tanto tempo) onde se fazia dos castigos, punições e execuções espectáculos públicos para entretenimento da plebe … é muito mais curta do que gostaria de acreditar …
Essa distância é vezes sem conta a distância de um teclado de computador … a distância de uma rede social.
A velocidade com que se julga e condena “o outro” é vertiginosa … na esmagadora maioria das situações sem qualquer reflexão profunda sobre o assunto, sem qualquer análise mais ampla e meramente baseados em percepções “fáceis” e imediatas facilmente se lavram sentenças que ficam pouco a dever às sentenças do tempo da inquisição.
O mais assustador é pensar que se esses julgamentos fossem de facto “reais”, “físicos” o que não faltaria seria cidadãos prontamente disponíveis para “atirar a primeira pedra”, caso a sentença fosse a de apedrejamento como infelizmente ainda acontece em alguns países neste nosso planeta.
É nesse campo fecundo de condenação do outro, de populismo “low-cost” que os aprendizes de mussolíní (ou salazar) do mundo (Portugal não é excepção) encontram um terreno muito fértil para propagar as suas ideologias repugnantes ( a ascensão eleitoral da extrema direita por essa Europa e mundo fora é disso mesmo a maior e mais triste evidência).
E vem isto a propósito de quê?

Vem isto a propósito do regresso em massa do hábito salazarista de tantos portugueses se terem tornado, ou terem descoberto em si mesmos, o papel de “polícia de costumes” … o papel de polícia de rede social em que a partir de uma imagem, de “uma” posta (será de pescada) facebookiana, se condena outros portugueses se possível à morte …
Vem isto a propósito das imagens que circularam nas redes socais sobre as pessoas que passeavam à beira mar durante a dita quarentena …

Ora bem … tentando ir ao cerne da questão … qual o objectivo da dita Quarentena?

O objectivo é evidentemente o de impedir ou pelo menos diminuir o contacto social ao máximo... essencialmente porque o contacto social, entre pessoas entenda-se (os animais não humanos tanto quanto se sabe não são hospedeiros do covid19), é uma das principais formas de contágio e disseminação do vírus.
É também o de impedir ao máximo o contacto das pessoas não só com outras pessoas mas também com superfícies e/ou objectos que possam estar infectados com o vírus.
Então creio que se faz uma interpretação demasiado totalitarista da dita quarentena quando se condena alguém por estar no exterior, nomeadamente para praticar alguma espécie de exercício físico. Como se fosse homicida em série. A verdade é que se o fizer mantendo uma distância social de segurança … fala-se em metro e meio, 2 metros … não só não está a fazer nada de errado como, a meu ver, está até a fazer algo francamente positivo.
Parece-me que a questão fundamental não é as pessoas estarem ou não ou ar livre mas estarem ou não a provocar alguma espécie de aglomeração social e a contactar com outras pessoas … o que pelas imagens que tive a oportunidade de ver não me pareceu acontecer em algum momento.

De qualquer forma esta situação remete para duas dimensões que a meu ver são, ou deveriam ser, fundamentais para o ser humano. A prática de desporto e o contacto com o “ar livre”, com os espaços exteriores.
Creio que essas duas dimensões não só não deveriam ser comprometidas ou prejudicadas durante a quarentena como até, se calhar mais do que nunca, se realça a importância que elas têm no bem estar físico e psicológico dos seres humanos.

Em relação ao desporto … bem, creio que estão mais do que documentados e reconhecidos os benefícios do mesmo, se praticado de forma consciente, nomeadamente para o próprio sistema respiratório e imunitário … Particularmente dos desportos de “ar livre”.
Estando os desportos colectivos neste contexto fortemente limitados, impossibilitados até, creio que não constitui qualquer factor acrescido de risco alguém praticar desporto sozinho num espaço exterior … e a meu ver faz todo o sentido, de resto, essa excepção estar de resto contemplada nas chamadas medidas de contenção. De resto como na generalidade dos países a atravessar pela actual situação de pandemia.
Se em relação ao desporto creio que não restam, ou não deveriam restar, grandes dúvidas … vamos agora para a segunda questão: o ar livre.

Não deverá o desporto ser praticado em espaço interior na perspectiva de que o fazer num espaço exterior poderá constituir um risco acrescido de contágio?

Esse risco, a existir, a meu ver é muito reduzido (só não digo nulo porque neste contexto como que não existe risco nulo) … de resto não me parece superior ao risco de contágio de uma ida às compras … hábito do qual poucos de nós podem prescindir.
Na verdade, creio que o risco é sem dúvida muito superior em espaços interiores do que exteriores.
É nos espaços interiores, artificiais por assim dizer, que a generalidade dos vírus - e calculo que o covid-19 esteja longe de constituir uma excepção - encontram as condições ideais para subsistir e propagarem-se.
A verdade é que a generalidade dos vírus têm uma esperança de vida extremamente curta no “meio natural”.. o covid-19 parece, não obstante, ter uma capacidade de resistência superior mas, ainda assim, até o próprio sol e a luz, por exemplo, constitui um elemento hostil para a proliferação dos vírus.
Paradoxalmente (ou não) é nos próprios espaços mais higienizados que, muitas vezes, os vírus encontram condições mais propícias para a sua disseminação.
Em ambientes de temperatura controlada … e claro, particularmente em locais onde houver uma grande concentração/circulação de pessoas (ou seja, potenciais hospedeiros) … e a particularidade dos vírus é precisamente a de precisarem de “hospedeiros” para sobreviver … já que no exterior as suas hipóteses são em geral bastante limitadas.
Não por acaso, se usarmos como linha de referência por exemplo um das maiores pandemias do século passado, a tuberculose, os sanatórios localizavam-se habitualmente em lugares particularmente arejados, nomeadamente na linha da costa ou em locais de considerável altitude. No fundo locais também com elevada exposição solar e sobretudo bastante “ventilados” …

Por outro lado, e essa é uma questão sobre a qual gostaria sem dúvida de ver muito mais produção científica, tendo a acreditar que nos ambientes “naturais”, nomeadamente os espaços exteriores, as próprias condições “naturais” e a presença de outros micro-organismos, que eventualmente competem com esses mesmos vírus, constituem um mecanismo “natural” de controlo dos mesmos. Diversos vírus que acabaram por adquirir contornos epidémicos num passado recente são precisamente vírus que se encontravam presentes em determinados habitats, nomeadamente em determinadas espécies, sem constituir qualquer carácter epidémico … até ao momento em que esses habitats foram de alguma forma ocupados/destruídos pelos humanos.

Parece-me então que o contacto com o “ar livre” é uma necessidade fundamental de qualquer ser e os benefícios são também imensos. Dessa forma parece-me que os benefícios de manter e até incentivar a frequência de espaços “livres” … nomeadamente parques, jardins, beira-mar superam largamente potenciais riscos de propagação viral … enquanto que os benefícios são sobejamente conhecidos os potenciais riscos para além de extremamente reduzidos são, por agora, essencialmente teóricos … do que se sabe os contágios têm acontecido essencialmente ou exclusivamente em espaços fechados e, claro, especialmente em locais efectivamente de risco: como hospitais, lares, locais de trabalho … e claro, em situação claras de contacto próximo com alguém infectado.

Por outro lado, e claro que só podemos por agora especular, porque será que por exemplo na China e na Coreia houve uma taxa de mortalidade bastante baixa considerando a quantidade total de contágios? Uma das possíveis explicações não será precisamente por a população chinesa e suponho que coreana ter tendencialmente um estilo de vida mais saudável do que as populações europeias? E se pensarmos por exemplo na população mais idosa … em que a prática de exercício no exterior, nomeadamente Tai-Chi, nos parques é uma realidade muito comum … é um contraste quase brutal com a realidade “ocidental” em que muitas vezes os idosos passam o dia “colados” à tv sentados no sofá … colados à tv a consumir conteúdos, por exemplo, como os da cmtv … que é precisamente tudo o que é preciso num momento em que urge manter a maior tranquilidade possível numa situação que é naturalmente de alarme.
Claro que existem muitos outros factores a considerar … nomeadamente do ponto de vista ecológico, da organização social (e investimento ou desinvestimento nos sistemas de saúde pública, como tem vindo a acontecer sistematicamente na dita Europa do Sul) … e é fundamental enquanto sociedade reflectirmos de forma aprofundada sobre essas ilações.

Mas acima de tudo creio que é tempo de pararmos com a hipocrisia de escrever e partilhar posts coloridos de “vamos ficar bem” e depois passarmos o tempo a debitar ódio ou demonizar aqueles que não hajam de acordo com aquilo que supostamente é a “ordem social” … sem sequer nos questionarmos até que ponto é que determinadas normas sociais fazem ou não sentido ou correspondem ou não à realidade dos factos.

Qual é a lógica de condenar por exemplo uma família de 4 pessoas que caminhe junto ao mar se mantêm uma distância de segurança em relação às outras pessoas em redor? É o medo de que alguma dessas pessoas possa contagiar outra do grupo se na verdade passam horas, dias, fechados no mesmo espaço doméstico?
Ou um casal? Será que os casais deixaram de dormir juntos, ter relações durante a quarentena? Qual é então o mal de caminharem os dois de mãos dadas num espaço natural?
A situação é particularmente assustadora … é natural vivermos imersos numa atmosfera de medo … mas creio que é fundamental não perdermos um certo sentido de “normalidade” … e sobretudo não perdermos a nossa humanidade em ódios e juízos fáceis contra o outro …
A prática de exercício físico é fundamental.
O usufruto do “ar livre” a meu ver também … e parece-me bastante errado qualquer decisão ou política que prive os seres desse usufruto e contacto … num período em que, se calhar, mais do que nunca ele é necessário.
É perfeitamente possível usufruir do “ar livre” sem contacto social … e mesmo considerando a gravidade do contexto, parece-me que é ser mais “papista do que o papa” a privação ou forte limitação desse direito e necessidade fundamental.

Por agora era só este mensagem/reflexão que gostava de partilhar.
Espero que no final desta tempestade fique precisamente essa lição: a da necessidade de passarmos mais tempo em contacto com a Natureza … com actividades que passem mais pelo valorização do aspecto humano … e talvez menos tempo em actividades diria mais alienantes … como passarmos horas em shoppings … ou fechados em casa em frente ao ecrã … seria óptimo se de um acontecimento trágico sobre o qual temos relativamente pouco controlo … pudéssemos trazer mudanças positivas àquilo que está sobre o nosso controlo, nomeadamente as decisões que tomamos na nossa vida e de como investimos o nosso tempo e energia.
Obrigado pelo tempo que investiram a ler esta reflexão. Espero que vos tenha sido de alguma forma útil.

Um abraço
Pedro Jorge Pereira

PJP.ECOLUTION

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