Hoje
fui até ao Parque do Covelo. Quando caminhávamos pela relva via-se
um manto completamente desprovido de folhas. A razão bem simples e
habitual: a espaços viam-se pequenas formações de folhas
amontoadas.
Aquilo
que parece um gesto banal e natural nos nossos chamados “espaços
verdes” é, a meu ver, profundamente sintomático da forma como
somos quase analfabetos no que à Natureza diz respeito... e passo a
explicar:
As
folhas que numa visão antropocêntrica talvez aparentem ser um
resíduo e como que algo inestético num relvado que alegadamente se
quer liso e, sobretudo, “limpo” são, na verdade, precisamente o
oposto … são na verdade um elemento fundamental numa cadeia de
interacções e dinâmicas próprias dos ecossistemas.
As
folhas que caiem são fundamentais aos mais variados níveis. Desde
logo são elas que quando se decompõem vai nutrir a terra com
nutrientes essenciais. Para além disso permitem a retenção da tão
fundamental humidade do solo. Pode-se ainda acrescentar que protegem
o solo de uma excessiva radiação solar e aquecimento em geral.
Também para todo um conjunto de espécies que por sua vez vão
enriquecer o solo elas oferecem protecção, alimento e humidade. Há
um outro aspecto bastante ligado a esse e que se prende com a forma
como nos ditos espaços verdades a vegetação é quase
obsessivamente cortada e as consequências que isso implica … mas
por agora não me vou focar nessa questão.
Outro
aspecto muitas vezes esquecido prende-se com o facto dessas folhas
conterem sementes …
Nunca
mais me esqueci de algo que aprendi há já cerca de 17 anos na
Eco-Comunidade de ZEGG, relativamente próximo de Berlim.
Na
área da comunidade existia inicialmente uma floresta monocultural de
pinheiros creio. Começaram então a solicitar aos serviços
camarários da cidade que lhes fornecessem as folhas que apanhavam
dos diversos jardins geridos pela autarquia. Aquilo que era visto
como um “desperdício” começou na verdade e ser compreendido
como um recurso de enorme valor.
O
pedido foi acedido e começaram então a utilizar essas folhas …
espalhando-as no bosque e outras usando para composto.
O
que sucedeu foi que passados alguns anos nessa mesma floresta começou
a surgir toda uma diversidade de espécies muito graças às sementes
contidas nas folhas.
Sempre
que vejo os recursos que os serviços camarários (e não só)
investem diariamente para remover as folhas do chão … não sei se
por motivos estéticos (o que acho uma pena porque acho tão mais
belo o chão coberto de um manto de folhas e pequenos ramos), se por
motivos culturais (porque já se faz assim há muitos anos), se por
motivos de simples ignorância porque muitas pessoas acham que se o
chão tem folhas é porque não é cuidado e está “sujo” …
seja por que for … considero um tremendo desperdício de tempo e de
recursos humanos em algo que ecologicamente me parece evidentemente
um enorme equívoco … e penso … investe-se tanto tempo e recursos
em algo que resulta num enorme empobrecimento do ecossistema ao mesmo
tempo que existem imensos espaços, nomeadamente públicos, que
carecem de um enorme tempo e investimento tendo em vista a sua
recuperação, nomeadamente ecológica … sobretudo através da
eliminação de espécies invasoras e remoção de resíduos da mais
variada espécie.
Quando
vejo a forma como trabalham os serviços camarários (e não só) só
me ocorre como sabemos ler tão pouco … a Natureza. Como funcionam
os ecossistemas … o que podemos e devemos fazer para a sua
valorização, recuperação, regeneração.
E
geração após gerações continuamos a fazer … merda. A
prejudicar mais do que a beneficiar. Felizmente há excepções mas
ainda continuam a ser demasiadamente isso: excepções.
Parece-me
que seria fundamental os currículos educativos conterem uma
disciplina de ecologia e cidadania … ou ecologia e estilo de vida …
de forma a podermos aprender a ter um estilo de vida mais consciente,
com muito menor impacto ecológico, mais integrado nas dinâmicas e
equilíbrio dos ecossistemas … também de forma a podermos ter um
papel cada vez mais benéfico nos ecossitemas …desde logo começando
por deixar as folhas onde elas devem estar e onde têm uma função
fundamental: no solo!
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