A
propósito do COVID-19 mas não só ...
Para
quem não me conhece, sou o Pedro Jorge Pereira, dinamizador, entre
outros, do Projecto PJP.ECOLUTION e naquilo que é o meu trabalho
diário enquanto “semeador da mudança” vou fazendo por observar
o mundo e a sociedade da forma o mais atenta, consciente e profunda
que me é possível.
Sendo
uma questão que, inevitavelmente, marca profundamente a actualidade
e mexe com tantas outras questões de forma mais ou menos directa
relacionadas, não posso claro deixar de também partilhar algumas
das principais reflexões que me ocorrem no que diz respeito ao
choque provocado pela Pandemia de Covid-19.
São
contudo reflexões que funcionam mais como preâmbulo de uma análise
mais alongada e profunda que tenciono fazer e brevemente irei
partilhei. Caso suscite o vosso interesse, fiquem atentos à página
do projecto PJP.ECOLUTION.
Começo
por dizer que os meus conhecimentos técnicos sobre a área em
questão são naturalmente bastante limitados e não tenho pretensão
de questionar aquilo que são os dados científicos e técnicos mais
ou menos consensuais até ao momento … não obstante de a certos
níveis não haver ainda propriamente um consenso …
Assim
sendo a minha análise precede essencialmente da minha experiência e
observação, ao longo destes anos, digamos, de activista eco-social
daquilo que são as dinâmicas sociais e também … ecológicas dos
ecossistemas naturais.
Suponho
que para alguns poderão trazer alguns elementos novos de reflexão …
para outros nem por isso e claro, valem o que valem para cada um …
estou claro receptivo a críticas, comentários e terei todo o prazer
(nem sempre toda a disponibilidade) em discutir ideias. Especialmente
quando pudermos voltar a estar juntos socialmente e fisicamente.
Então
… vamos a isto …
Desde
logo acho interessante, quer dizer, na verdade acho bastante triste
observar que a distância que vai dos nossos dias até ao tristes
tempos da inquisição … até tempos (que não vão assim há tanto
tempo) onde se fazia dos castigos, punições e execuções
espectáculos públicos para entretenimento da plebe … é muito
mais curta do que gostaria de acreditar …
Essa
distância é vezes sem conta a distância de um teclado de
computador … a distância de uma rede social.
A
velocidade com que se julga e condena “o outro” é vertiginosa …
na esmagadora maioria das situações sem qualquer reflexão profunda
sobre o assunto, sem qualquer análise mais ampla e meramente
baseados em percepções “fáceis” e imediatas facilmente se
lavram sentenças que ficam pouco a dever às sentenças do tempo da
inquisição.
O
mais assustador é pensar que se esses julgamentos fossem de facto
“reais”, “físicos” o que não faltaria seria cidadãos
prontamente disponíveis para “atirar a primeira pedra”, caso a
sentença fosse a de apedrejamento como infelizmente ainda acontece
em alguns países neste nosso planeta.
É
nesse campo fecundo de condenação do outro, de populismo “low-cost”
que os aprendizes de mussolíní (ou salazar) do mundo (Portugal não
é excepção) encontram um terreno muito fértil para propagar as
suas ideologias repugnantes ( a ascensão eleitoral da extrema
direita por essa Europa e mundo fora é disso mesmo a maior e mais
triste evidência).
E
vem isto a propósito de quê?
Vem
isto a propósito do regresso em massa do hábito salazarista de
tantos portugueses se terem tornado, ou terem descoberto em si
mesmos, o papel de “polícia de costumes” … o papel de polícia
de rede social em que a partir de uma imagem, de “uma” posta
(será de pescada) facebookiana, se condena outros portugueses se
possível à morte …
Vem
isto a propósito das imagens que circularam nas redes socais sobre
as pessoas que passeavam à beira mar durante a dita quarentena …
Ora
bem … tentando ir ao cerne da questão … qual o objectivo da dita
Quarentena?
O
objectivo é evidentemente o de impedir ou pelo menos diminuir o
contacto social ao máximo... essencialmente porque o contacto
social, entre pessoas entenda-se (os animais não humanos tanto
quanto se sabe não são hospedeiros do covid19), é uma das
principais formas de contágio e disseminação do vírus.
É
também o de impedir ao máximo o contacto das pessoas não só com
outras pessoas mas também com superfícies e/ou objectos que possam
estar infectados com o vírus.
Então
creio que se faz uma interpretação demasiado totalitarista da dita
quarentena quando se condena alguém por estar no exterior,
nomeadamente para praticar alguma espécie de exercício físico.
Como se fosse homicida em série. A verdade é que se o fizer
mantendo uma distância social de segurança … fala-se em metro e
meio, 2 metros … não só não está a fazer nada de errado como, a
meu ver, está até a fazer algo francamente positivo.
Parece-me
que a questão fundamental não é as pessoas estarem ou não ou ar
livre mas estarem ou não a provocar alguma espécie de aglomeração
social e a contactar com outras pessoas … o que pelas imagens que
tive a oportunidade de ver não me pareceu acontecer em algum
momento.
De
qualquer forma esta situação remete para duas dimensões que a meu
ver são, ou deveriam ser, fundamentais para o ser humano. A prática
de desporto e o contacto com o “ar livre”, com os espaços
exteriores.
Creio
que essas duas dimensões não só não deveriam ser comprometidas ou
prejudicadas durante a quarentena como até, se calhar mais do que
nunca, se realça a importância que elas têm no bem estar físico e
psicológico dos seres humanos.
Em
relação ao desporto … bem, creio que estão mais do que
documentados e reconhecidos os benefícios do mesmo, se praticado de
forma consciente, nomeadamente para o próprio sistema respiratório
e imunitário … Particularmente dos desportos de “ar livre”.
Estando
os desportos colectivos neste contexto fortemente limitados,
impossibilitados até, creio que não constitui qualquer factor
acrescido de risco alguém praticar desporto sozinho num espaço
exterior … e a meu ver faz todo o sentido, de resto, essa excepção
estar de resto contemplada nas chamadas medidas de contenção. De
resto como na generalidade dos países a atravessar pela actual
situação de pandemia.
Se
em relação ao desporto creio que não restam, ou não deveriam
restar, grandes dúvidas … vamos agora para a segunda questão: o
ar livre.
Não
deverá o desporto ser praticado em espaço interior na perspectiva
de que o fazer num espaço exterior poderá constituir um risco
acrescido de contágio?
Esse
risco, a existir, a meu ver é muito reduzido (só não digo nulo
porque neste contexto como que não existe risco nulo) … de resto
não me parece superior ao risco de contágio de uma ida às compras
… hábito do qual poucos de nós podem prescindir.
Na
verdade, creio que o risco é sem dúvida muito superior em espaços
interiores do que exteriores.
É
nos espaços interiores, artificiais por assim dizer, que a
generalidade dos vírus - e calculo que o covid-19 esteja longe de
constituir uma excepção - encontram as condições ideais para
subsistir e propagarem-se.
A
verdade é que a generalidade dos vírus têm uma esperança de vida
extremamente curta no “meio natural”.. o covid-19 parece, não
obstante, ter uma capacidade de resistência superior mas, ainda
assim, até o próprio sol e a luz, por exemplo, constitui um
elemento hostil para a proliferação dos vírus.
Paradoxalmente
(ou não) é nos próprios espaços mais higienizados que, muitas
vezes, os vírus encontram condições mais propícias para a sua
disseminação.
Em
ambientes de temperatura controlada … e claro, particularmente em
locais onde houver uma grande concentração/circulação de pessoas
(ou seja, potenciais hospedeiros) … e a particularidade dos vírus
é precisamente a de precisarem de “hospedeiros” para sobreviver
… já que no exterior as suas hipóteses são em geral bastante
limitadas.
Não
por acaso, se usarmos como linha de referência por exemplo um das
maiores pandemias do século passado, a tuberculose, os sanatórios
localizavam-se habitualmente em lugares particularmente arejados,
nomeadamente na linha da costa ou em locais de considerável
altitude. No fundo locais também com elevada exposição solar e
sobretudo bastante “ventilados” …
Por
outro lado, e essa é uma questão sobre a qual gostaria sem dúvida
de ver muito mais produção científica, tendo a acreditar que nos
ambientes “naturais”, nomeadamente os espaços exteriores, as
próprias condições “naturais” e a presença de outros
micro-organismos, que eventualmente competem com esses mesmos vírus,
constituem um mecanismo “natural” de controlo dos mesmos.
Diversos vírus que acabaram por adquirir contornos epidémicos num
passado recente são precisamente vírus que se encontravam presentes
em determinados habitats, nomeadamente em determinadas espécies, sem
constituir qualquer carácter epidémico … até ao momento em que
esses habitats foram de alguma forma ocupados/destruídos pelos
humanos.
Parece-me
então que o contacto com o “ar livre” é uma necessidade
fundamental de qualquer ser e os benefícios são também imensos.
Dessa forma parece-me que os benefícios de manter e até incentivar
a frequência de espaços “livres” … nomeadamente parques,
jardins, beira-mar superam largamente potenciais riscos de propagação
viral … enquanto que os benefícios são sobejamente conhecidos os
potenciais riscos para além de extremamente reduzidos são, por
agora, essencialmente teóricos … do que se sabe os contágios têm
acontecido essencialmente ou exclusivamente em espaços fechados e,
claro, especialmente em locais efectivamente de risco: como
hospitais, lares, locais de trabalho … e claro, em situação
claras de contacto próximo com alguém infectado.
Por
outro lado, e claro que só podemos por agora especular, porque será
que por exemplo na China e na Coreia houve uma taxa de mortalidade
bastante baixa considerando a quantidade total de contágios? Uma das
possíveis explicações não será precisamente por a população
chinesa e suponho que coreana ter tendencialmente um estilo de vida
mais saudável do que as populações europeias? E se pensarmos por
exemplo na população mais idosa … em que a prática de exercício
no exterior, nomeadamente Tai-Chi, nos parques é uma realidade muito
comum … é um contraste quase brutal com a realidade “ocidental”
em que muitas vezes os idosos passam o dia “colados” à tv
sentados no sofá … colados à tv a consumir conteúdos, por
exemplo, como os da cmtv … que é precisamente tudo o que é
preciso num momento em que urge manter a maior tranquilidade possível
numa situação que é naturalmente de alarme.
Claro
que existem muitos outros factores a considerar … nomeadamente do
ponto de vista ecológico, da organização social (e investimento ou
desinvestimento nos sistemas de saúde pública, como tem vindo a
acontecer sistematicamente na dita Europa do Sul) … e é
fundamental enquanto sociedade reflectirmos de forma aprofundada
sobre essas ilações.
Mas
acima de tudo creio que é tempo de pararmos com a hipocrisia de
escrever e partilhar posts coloridos de “vamos ficar bem” e
depois passarmos o tempo a debitar ódio ou demonizar aqueles que não
hajam de acordo com aquilo que supostamente é a “ordem social” …
sem sequer nos questionarmos até que ponto é que determinadas
normas sociais fazem ou não sentido ou correspondem ou não à
realidade dos factos.
Qual
é a lógica de condenar por exemplo uma família de 4 pessoas que
caminhe junto ao mar se mantêm uma distância de segurança em
relação às outras pessoas em redor? É o medo de que alguma dessas
pessoas possa contagiar outra do grupo se na verdade passam horas,
dias, fechados no mesmo espaço doméstico?
Ou
um casal? Será que os casais deixaram de dormir juntos, ter relações
durante a quarentena? Qual é então o mal de caminharem os dois de
mãos dadas num espaço natural?
A
situação é particularmente assustadora … é natural vivermos
imersos numa atmosfera de medo … mas creio que é fundamental não
perdermos um certo sentido de “normalidade” … e sobretudo não
perdermos a nossa humanidade em ódios e juízos fáceis contra o
outro …
A
prática de exercício físico é fundamental.
O
usufruto do “ar livre” a meu ver também … e parece-me bastante
errado qualquer decisão ou política que prive os seres desse
usufruto e contacto … num período em que, se calhar, mais do que
nunca ele é necessário.
É
perfeitamente possível usufruir do “ar livre” sem contacto
social … e mesmo considerando a gravidade do contexto, parece-me
que é ser mais “papista do que o papa” a privação ou forte
limitação desse direito e necessidade fundamental.
Por
agora era só este mensagem/reflexão que gostava de partilhar.
Espero
que no final desta tempestade fique precisamente essa lição: a da
necessidade de passarmos mais tempo em contacto com a Natureza …
com actividades que passem mais pelo valorização do aspecto humano
… e talvez menos tempo em actividades diria mais alienantes …
como passarmos horas em shoppings … ou fechados em casa em frente
ao ecrã … seria óptimo se de um acontecimento trágico sobre o
qual temos relativamente pouco controlo … pudéssemos trazer
mudanças positivas àquilo que está sobre o nosso controlo,
nomeadamente as decisões que tomamos na nossa vida e de como
investimos o nosso tempo e energia.
Obrigado
pelo tempo que investiram a ler esta reflexão. Espero que vos tenha
sido de alguma forma útil.
Um
abraço
Pedro
Jorge Pereira
PJP.ECOLUTION